Friday, October 27, 2006

Capítulo IX.

Nunca consigo beber só uma e depois da segunda cerveja fui pra casa com vontade de declamar uma canção com sonoridade de outro mundo em linguagem bem só nossa e num vocabulário forte, profético e apocalíptico que arrepiem nossos pelos e reverbere em nossas almas. Como eu queria Lua, que você sentisse exatamente nesse instante, o maior amor da terra e ele brota dos meus poros. Amor que assusta e muda nossas enzimas para um sítio ativo em formato de coração incandescente e tudo que digo é muito pouco. Nada na vida é tão magistral como dobrar essa esquina e ver acesa a luz do AP com seu vulto na janela.
Subo os cinco lances de escada sem me dar conta e, quando tava colocando a chave na fechadura, ela abriu a porta com aquele sorriso que para muitos seria um sorriso de boneca, mas pra mim era o arquétipo universal e imortalizado de algo belo e inexplicável, era o símbolo vivo do que se entende por amor e esse amor quase sagrado e eu, profano e mudo, inteiramente naufragado, colei minha boca em seu sorriso e a levei em meus braços para o quarto e, por mais desgastada que possa parecer essa cena, ela ocorre como vez primeira; inesperada, vibrante e desesperada.
_Meu bem o que deu em você hoje?- ela perguntava enquanto beijava minha orelha e eu derretendo em seu pescoço, passei a mão no botão da composta calça de professora, desabotoei, abri o zíper, tirei a calça e comecei a beija-la desde o dedo mindinho que beijei e lambi junto com os outros dedos do pé, dei uma leve mordida naquela panturrilha inenarrável, beijei atrás do joelho e, quando comecei a passar a língua na região dos músculos adutores da coxa, ela começou a gemer, aí eu afastei a calcinha pro lado e beijei sua boceta como beijo a sua boca e meus lábios visgaram e era um cheiro sacrossanto materializando meu êxtase. Enquanto tirava a calcinha, ela foi abrindo a blusa de botão e era quase uma ordem pra chupar aquele peitinho, mas só passei a língua no morango quando minha pica se sentiu aquecida, acolhida e tão radiante quanto eu. Não somente pelo fato de haver materializado na escrita, mas levarei as minúcias dessa noite para o túmulo e, se depois de morto, puder andar sobre os jardins do meu sepulcro, ainda viverei com tal lembrança. Espero que o espírito não seja imortal como proclamam. Viver eternamente com a consciência de que momentos como esses são efêmeros e não voltam jamais não seria coisa lá muito agradável. Quando acordados, pensamos e dormindo, sonhamos. Nunca haverá descanso pra esfrangalhada consciência? Se não houver repouso pelo menos pode existir resposta e isso seria um ótimo recomeço.
Será que Nietzsche estava com a razão? Somos seres realmente desprovidos de compaixão para com o próximo e nossa idéia de caridade é apenas um tipo de comportamento egoísta de cordeiro cristão ocidental querendo tomar parte num rebanho de ideal medievo? O amor, se tomarmos o nobre sentimento como exemplo, não estaria condicionado a idéia de sucesso pessoal na condução de uma relação quase sempre idealizada e movida por algum filme, livro ou trilha sonora ou, até mesmo, um devaneio? E aquilo que sentia naquele instante? Aquela nítida alteração do meu psicológico e do meu metabolismo poderia ter explicação na tradição histórica da metafísica ou da práxis cientifica? É melhor acreditar em Corintios capítulo 13 e dormir em paz ou deixar pra lá.
Oh, criaturas intergalácticas! Musas cósmicas do brilho da estrelas! Desçam desse céu despedaçado e entrem pela janela pra admirar o que é humano e sagrado humano sendo e regozijem-se e se entrelacem criando sóis, cometas ou corpos que queimam qual meteorito azul-piscina nessa Brotas sempre cinza.
_Vai porra, isso, vai, estica meu cabelo, mete, sshh..., mete, vai, humm, ái, me bate vái - e eu batia frenética e apaixonadamente naquela bunda enquanto o suor de meus cabelos pingava em suas costas a intervalos regulares no vai e vem da languidez dos movimentos. Com certeza, a criação do universo coexistia em sinonímia com aquela visão de Lua de quatro. O Big-Bang ocorreu entre suas pernas numa noite como essa.
Gozei e ainda fiquei um tempinho com meu pau dentro duma Lua ofegante e de bruços, comprimida por meu peso, embalsamada na lascívia de um cenário deslumbrante e habitual.
Caí ao seu lado e ela me beijou levemente com os olhos entreabertos e os seus olhos se fecharam. Naquele momento tudo que havia era a fugaz sensação de que só existia no planeta o nosso leito, os astros e o barulho dos carros pela fresta da janela. Os meus olhos fecharam-se em seguida e, se naquela noite, tive sonhos que não lembro, estes nunca seriam, tão oníricos assim. E dei-lhe boa noite em francês por telepatia.

Capítulo X.

Luana era uma menina nascida em Serrinha e criada em Feira de Santana para onde fora aos doze anos quando o pai, que era gerente de banco, havia sido transferido. A mãe era formada em nutrição, mas só fazia beber, tomar antidepressivos e mentir pro pobre marido de uma forma ignominiosa. Tanto a mãe como as duas filhas eram verdadeiras beldades, assim como as tias, primas, sobrinhas e aí vai. Uma família inteira de mulher bonita.
Na adolescência Luana desfilava e foi até Miss Bahia certa vez. Ela era três anos mais velha que eu e quando tava saindo da universidade, ela tava entrando como professora substituta da instituição. Lua me contou que era uma garota extremamente superficial e que queria na verdade fazer Enfermagem e só fez Letras Vernáculas porque a concorrência era menor, mas acabou se apaixonando pela área e esses lances.
Como disse no capítulo primeiro desse livro, a vi num ônibus pela primeira vez quando ia pra UEFS. Algumas semanas depois, quando trocava idéia com meu amigo Tom Raiva num dos caminhos do Feira VI, ela passou com aquele andar magnífico e cumprimentou Tom que retribuiu o cumprimento com a cara de sacana e ficamos olhando mudos pra bunda dela até que dobrasse a esquina e sumisse dos nossos olhos. A pergunta foi inevitável:
_Quem é essa aí seu Tom?
_Minha professora de Literatura Brasileira II.
_Então ela gosta de poesia...- mal terminei a frase e atravessei o campo correndo na direção daquela semideusa. A única característica que faltava a sua pessoa para adentrar o panteão dos Deuses era o dom da imortalidade e Raiva ficou para trás gritando que ela era casada.
Numa certa ocasião, na cidade histórica de Cachoeira, havia conquistado uma morena muito linda após declamar a primeira parte de A canção desesperada de Neruda, mas ela era professora de Literatura, podia conhecer a composição, mas tava muito perto, aí eu reduzi os passos, toquei em seu ombro e disse:
_Moça, não pense que sou maluco, não costumo fazer essas coisas, mas eu preciso te dizer essas palavras. E recitei o poema com a voz muito trêmula e no final ela me encarou e falou com um meio sorriso.
_Você ta tremendo, se acalme pra não ter uma síncope. Como é seu nome?
_Rafael, e o seu?
_Meu nome é Lua, Luana.
_Quer casar comigo?
_Eu nem te conheço e, além do mais, já sou casada. Gostei do poema, de quem é?
_É seu, ou melhor, de Neruda.
_Tenho que ir.
_Me dê seu telefone, e-mail, qualquer coisa.
_Pare com isso.
_Eu imploro!
_Você é muito apressado, mas vejo sinceridade em seu olhar...
_Anote meu telefone, eu queria te beijar, mas temo a sua reação.
_Eu ia ficar pirada, morrendo de ódio.
A palavra ódio veio acompanhada de um comedido sorriso de canto de boca, olhei em volta, a rua estava vazia e, quando ela terminou de anotar o meu número no celular, segurei em sua nuca e roubei aquele beijo. Ela me afastou com o olhar esbugalhado e disse:
_Qual é! Cê ta doido é?
_Me perdoe, por favor.
_Meu marido é muito conhecido em Feira, e se alguém viu?-a expressão dela tinha mudado completamente e vi que não tinha procedido da maneira certa.
_Você termina com ele e casa comigo.
_Tenho que almoçar, vou dar aula uma e meia.
_Você o ama?
_Quem?
_Seu marido.
_Isso é outra história. O que é que você faz?
_Componho e vendo Língua Inglesa e Portuguesa a preço de banana aqui em Feira.
_Você é musico?
_Não, escritor.
_Tô indo agora, tenho que ir.
_Foi mal.
_O quê?
_ O beijo.
_Não se preocupe, eu gostei.
_Eu te amo – por mais estranho que possa parecer, eu disse a celebre frase liquefeita das profundezas do meu ser e Luana sorriu e deslizou com aquele andar e esqueci de respirar por alguns segundos e o céu, a sol das doze, me chamava para as luzes em alquimia labiríntica.

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