Saturday, April 28, 2007

Capítulo XV.

Naquela noite esqueci de contar quantos socos, bicudas e cotoveladas aquele cara levou depois que Raiva e Seu Flávio entraram em cena e de lembrar o caminho que me levou aquele quarto de motel na Presidente Dutra, mas Alice era gostosa, com aquelas sobrancelhas estilo Elizabet Taylor, aquela tatuagem de duende entre a bunda e a perna esquerda, borboletas nas batatas, ideogramas no pescoço e que bocetinha linda tinha aquela velha amiga. Eu metia, metia e nada de gozar e tirava da boceta e colocava na boca e de novo na boceta e já havia tentado posições diversas e pensei que podia estar nervoso pelo fato de conhece-la há uma cara, até que ela veio com aquela frase pomposa e veemente:
_Come meu cu vai porra!
E o cu de Alice era tão apertado quanto meu coração naquele instante e eu gozei e gritei suando e sorrindo e notei que tinha um espelho no teto; eu sempre fui desligado mesmo.
Dormimos no motel e, pela manhã, vimos que ninguém tava com aqueles oitenta e dois reais e tive que ligar pro velho Carlinhos no Feira Quatro pra que fosse me tirar da enrascada.
_Meu filho, me tire dessa, tô precisando que você me empreste 82 reais que eu vim parar no Stillus Motel, não sei como, com uma figura e dormi nessa merda sem um centavo.
_Kákakakaka...Qui, qui, qui...Você ta fudido mesmo sacana que eu tô sem um conto – Como eu detestava aquela risada.
_Tô na merda mesmo!
_Eles aceitam cartão de crédito?
_Filho da puta!
_Daqui a pouco passo pra te pegar, ou melhor, te salvar.
_Valeu mesmo...
_Pare de se humilhar.
_Ok.
O sacana foi mais esperto que eu. Ganhou dinheiro fazendo próteses odontológicas e largou o curso de história e todo o engodo do ensino. Um grande piadista e uma criatura de bom gosto musical.
Mais são muitos personagens e eles borbulham em minha cabeça e, muitas vezes são mais vivos quando não escrevo. Nesses meses sem literatura e sem a sagrada missão da incansável busca da imortalidade nas páginas obituárias, os personagens crescem, muitos imprevisíveis e sem importância que acabam galopando e seus sorrisos são reais. Como escrever sobre delírios e sentimentos e frustrações e sonhos de estrelas além? É preciso sangue nessas páginas. Não sangue menstrual, mas alguma violência, um esquartejamento, um santo que nos envolva em música e éter e comida congelada de self-services de posto de gasolina. Algo ao mesmo tempo trágico, épico, contemporâneo e sensual, mas sensual é ser vulgar? Claro que é, e é nisso se encontra a sua ascensão. A primeira coisa seria delimitar um tema grandioso envolto em mistério profundo, adequado à linguagem universal dos best-sellers ocidentais com certos momentos disfarçando uma humanidade qualquer. Mas você quer que as palavras tomem vida por geração espontânea, ao léu e sem destino pré-estabelecido? O que o leitor tem a ver com essa merda toda? Creio que se o leitor estivesse interessado em discutir a relação do artista com a sua obra ira, com certeza, ás cartas de Van Gogh que, segundo Miller em Tropic of Cancer: “É a vitória do indivíduo sobre a arte”, mas isso já é uma outra história. Então deixemos o célebre pintor holandês e suas comoventes cartas ao irmão Théo para voltarmos a atmosfera feirense de um quarto de motel, onde eu não agüentei ver Alice no chuveiro e o contraste das tatuagens com sua pele branca lembrou-me Cruz e Souza. “Ó Formas alvas, brancas, Formas claras...” e o cheiro de perfume de erva doce em sua pele, a água com negro gosto de cabelos frios e minha pica no meio de suas pernas e a advertência do ministério da saúde sobre fuder sem camisinha e eu todo já lá dentro e que a sorte me proteja. Acho que protegeu. Tô vivo até hoje, escrevendo e de pau duro devido à lembrança daquele instante liquefeito. This is rock’n roll baby, the real one!